Foto: AI generated and hilarious (ainda não tenho esta barriga toda nem tampouco este glamour)
Desde que soube que estava grávida que tenho refletido muito sobre o trabalho versus a maternidade. Felizmente, hoje em dia (e já há algum tempo) já não tem que haver uma escolha, a mulher é profissional e é mãe e está tudo bem. Mas será ela profissional nos mesmos moldes que antes da maternidade?
Ao meu redor tenho-me deparado com vários casos de mulheres que engravidaram numa altura da carreira em que tinham já conquistado lugares de liderança e que, quando voltarem ao trabalho após a licença de maternidade, já sabem que vão regressar a uma posição inferior. Ao ouvir isto de duas mulheres no espaço de duas semanas, chocou-me não só a atitude das empresas, mas acima de tudo a complacência com que elas aceitaram e passaram a informação. Como assim perderam os lugares pelos quais tanto trabalharam até terem a “lata” de engravidar? Como assim estão bem com isso?
Percebo que os lugares tenham que ser temporariamente preenchidos, claro, mas a ideia não é regressarem aos mesmos assim que a licença de maternidade terminar?
Tendo em conta este panorama, não se percebe perfeitamente que tantas mulheres adiem ou desistam da maternidade? Não que o trabalho seja mais importante, mas torna-se difícil existir e contribuir para um mundo ainda tão injusto para quem tanto faz por ele.
Se por um lado temos uma pressão avassaladora por parte da sociedade para termos filhos, porque assim se decidiu que era o nosso propósito (discutível), por outro somos penalizadas, socialmente quando não os temos e profissionalmente quando decidimos tê-los.
Porém, da nossa parte – mulheres grávidas e profissionais ativas – também podem ser ditas algumas verdades.
Estatisticamente, trabalhamos até mais tarde na gravidez, mas também há casos em que algumas escolhem deixar de trabalhar muito cedo na gravidez, pedindo baixa médica que é facilmente concedida, sejamos sinceros. Aqui entre nós, ter quase o tempo inteiro da gravidez para preparar tudo para a chegada do bebé e para descansar soa-me muito bem, mas não o suficiente para arriscar o meu lugar na empresa. Claro que para algumas mulheres será mais apelativo do que para outras. Felizmente, gosto do meu trabalho, sinto-me muito bem por poder executá-lo e, acima de tudo, sinto-me incrivelmente grata pelo facto da pandemia ter trazido com ela a normalização do trabalho remoto. Uma vez que trabalho neste modelo, consigo trabalhar confortavelmente onde quer que esteja, pelo que não tenho “desculpa” para não continuar a trabalhar até ao final da gravidez (salvo se algum problema de saúde grave *bate na madeira* surgir).
Não quero com isto dizer de forma alguma que trabalhar até ao fim da gravidez é uma melhor prática do que tirar mais tempo para a viver. Nada disso. Cada mulher saberá melhor o que funciona para ela, tanto a nível pessoal, como profissional e até a nível de saúde mental. Não há uma escolha certa e uma errada. Para mim, funciona melhor assim, só isso.
E é este sentimento de gratidão que me invadiu e que se tem mantido ativo por aqui. Para além disso, tenho-me sentido mais criativa, desenvolvi um novo baralho para o Blume Creativity sobre a jornada da gravidez e assegurei um freelance incrível para o Estado e que é absolutamente irrecusável. Ou seja, arranjei ainda mais trabalho, mas não faz mal. É uma honra poder assegurar não só o meu sustento, mas também contribuir como parte igual para com o do ser que se irá juntar à nossa família daqui a uns meses. E não, não irei desistir de trabalhar por ele, nem essa é uma prática tão comum assim no nosso país ou sequer na Europa. É ótimo essa opção existir (se as finanças do casal e a vontade assim o permitirem), mas para mim a melhor opção seria sempre continuar a trabalhar. Quero que ele/ela me conheçam como sou, como sempre fui: motivada, inspirada e orgulhosa pelo que faço e consigo criar. Eu cresci com um pai e uma mãe trabalhadores e não sinto que tenha saído minimamente prejudicada por isso. Pelo contrário. Tenho dois exemplos próximos de progenitores que trabalhavam fora do lar para assegurar o nosso sustento e também por isso me sinto grata.
Uma coisa que ainda não contei é que trabalhei exclusivamente como freelancer durante um ano (Agosto 2022 – Agosto 2023) e calhou ter sido convidada para trabalhar a full-time com um dos meus clientes quase na mesma altura em que descobri que estava grávida. Os meus receios por uma possível instabilidade financeira decorrente de uma paragem de meses na carreira de freelancer (o equivalente à licença de maternidade) foram apaziguados pela segurança deste trabalho, como se tudo se tivesse encaixado na perfeição, como se me estivesse a garantir que esta era a altura ideal para alargar a família e assumir um cargo adicional como mãe CEO cá de casa.
Ainda faltam uns bons meses, mas sinto-me muito paz com a minha realidade de remote working mom e pronta para dar tudo em todos os papéis.
4 Comments
Vania Duarte
04/11/2023 at 7:36 AMSabes antes de ser mãe também me questionava como é que situações de mulheres já numa fase avançada da carreira acabavam por perder o que tinham conquistado e ficam ok com isso. Hoje que sou mãe há 10 meses consigo entender simplesmente porque o mercado de trabalho português não está feito para seres mãe e teres uma carreira profissional igual à que tinhas. Aquilo que o mercado espera é que sejas a mesma mas já não o és. Não és pior, mas não és igual e o que sinto é que para muitas empresas a licença de maternidade são umas férias e é espera-se que a pessoa volte e produza da forma que produzia antes de ir de licença. É impossível por muitos fatores que na verdade só vais conseguir perceber quando esse bebé gostoso estiver cá fora. Porque muitos são mesmo invisíveis aos olhos do mundo mas com uma carga imensa sobre a mulher. E mesmo tendo uma aldeia a suportar e um marido incrível a pressão e a culpa ui a culpa de nunca sermos suficientes em nada existe todos os dias. Sinto que a maternidade foi a maior chapada de humildade que alguma vez levei na vida e juro que passei a olhar para as mulheres que são mães e trabalham com um sentimento de “somos do caraças”.
Acho que o mercado de trabalho tinha muito a ganhar em tirar partido da mulher que se torna mãe e ganha valências incríveis mas honestamente não acho que em Portugal (na maioria das empresas) exista esse espaço e por isso acredito que muitas mulheres acabem por “preferir” baixar na carreira para conseguirem chegar a todo o lado com menos culpa 🙂
Super feliz por vocês 🧡 amo Catarina mama
Catarina Alves de Sousa
16/11/2023 at 12:13 PMSabes, eu também não acho nada que o mercado de trabalho valorize as mulheres que acabaram de passar por uma gravidez e por uma licença de maternidade, mesmo para mim sendo óbvio que, embora não sejam as mesmas, ganharam valências que lhes podem ser muito úteis também em contexto profissional. Também acho que não vou ser exatamente a mesma pessoa depois de ter o bebé, embora nenhum acontecimento marcante me deixe a achar que continuo igual. E isso é bom, a meu ver. Mas também não aceito baixar os braços enquanto perco oportunidades só por ser mãe. Isso não aconteceu, atenção, mas tenho visto a acontecer e revolto-me pelas outras.
Aquilo que exigem de nós é impossível: sermos mega profissionais, mas não abdicarmos da maternidade em prol da carreira. Easier said than done. Há pessoas que lutam a vida toda para chegar ao suposto “topo”, mas assim que se tornam mães, são questionadas por tudo e por nada. Não entendo. Acho que também parte de nós bater o pé e não perder o foco por demasiado tempo. Vamos ver como é que reajo à nova realidade daqui a uns meses. 😛 Mas já estou preparada mentalmente para desfocar do trabalho, ainda que temporariamente.
Obrigada, minha querida, e obrigada também por ainda estares desse lado a ler-me. 🙂
Inês
20/12/2023 at 6:37 PMBem, nunca estive grávida, mas também já “despedi” o meu psiquiatra, porque nunca estava disponível fora das consultas, para uma eventual urgência, e só conseguia marcar consultas com meses de antecedência, o que para questões psiquiátricas é terrível.
Enfim, acho que temos todo o direito de sermos seguidos, em todas as áreas, por médicos que nos ouçam, que respondam às nossas questões e que correspondam às nossas necessidades.
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