Conheci o Museu do Traje muito recentemente (no mesmo dia em que fui ao Parque Botânico do Monteiro-Mor) e só me arrependo de não o ter feito mais cedo. Correndo o risco de me tornar repetitiva, continuo espantada com a quantidade de coisas que ainda não conheço em Lisboa apesar de já cá viver há dez anos.
Inicialmente, achava que o Museu do Traje não seria dos que teria mais interesse para mim, mas enganei-me. Na verdade, até me fez pensar muito sobre muita coisa. Já vos explico porquê. 🙂
A exposição que lá estava na altura (e creio que ainda está) é a Coleção Anadia que se compõe de (de acordo com o site oficial do Museu Nacional do Traje):
117 peças de traje e 96 acessórios, usados entre 1750 e 1910, apresentados em 3 núcleos: traje de corte masculino, ao nível do que melhor existe nas coleções nacionais, num núcleo coeso em termos de moda masculina dos séculos XVIII/XIX, traje feminino do quotidiano e de festa, documentando vários momentos da moda feminina ao longo do século XIX e traje infantil, um núcleo bastante interessante pela sua diversidade – bebé e criança, de festa e cerimonial ao quotidiano, integrando exemplares raros de encontrar dos séculos XIX/XX.
De 1750 a 1910 (Coleção Anadia)
Se repararem no vestido feminino da imagem de cima e nos vestidos da imagem de baixo, vão poder ver que, além das diferenças entre o traje masculino e o feminino, temos ainda diferenças entre o traje feminino. Nesta altura, as linhas e estilos dos trajes das mulheres jovens e mais maduras eram muito diferentes. Dou-me por contente por hoje em dia as diferenças serem mais atenuadas e subtis, algo que resulta também da percepção do que é ser “velho” ou “novo”. Quero, com isto, dizer que actualmente vemos as pessoas como jovens até mais tarde (basta ver que a idade limite do Cartão Jovem se alterou desde há uns aninhos para cá).
Mas, na verdade, a evolução do traje vai muito mais além de 1910, embora seja por essa data que termina a colecção Anadia. Juntando as outras roupas e acessórios que se vêem pelo museu, podemos observar a evolução das tendências até aos anos 2010, portanto, até agora. Digam lá se este museu tem ou não tem um espólio riquíssimo! 🙂
E devo dizer que adorei os padrões florais nos trajes masculinos!
As peças deste conjunto de fotos (acima) são de roupa interior. Na altura baptizei esta sala (porque sou muito engraçadinha) de “Victorian Secret”. Ahahah (get it?) 😛
Já repararam que a roupa interior é sempre branca? Pelo menos os exemplares que vi neste colecção. Com a (escassa) quantidade de banhos que se tomavam nesta altura, imagino que a roupa interior denunciasse quando é que já estava na hora de tomar a bela da banhoca esporádica. Ahahahah
Hoje em dia, já há cientistas a dizer que tomamos demasiado banho e que nem é preciso tanto, mas desculpem lá, prefiro mil vezes o excesso de limpeza do que o contrário (obvs.).
De qualquer forma, o branco era a cor escolhida para a maioria da roupa interior Victoriana porque era frequentemente lavada em rios e tanques para, depois, ser seca ao sol. Os tecidos tingidos não conseguiam aguentar este tratamento sem perder a cor, daí a optarem pelo branco.
Pormenores do Museu
Dos anos 20 a 2010’s
Agora, em retrospectiva, tenho pena de não ter fotografado todas as épocas, mas em resumo, foi incrível ver como se passou do espartilho para os vestidos ligeiramente mais curtos, largos e sem forma dos anos 20. De uma cintura espartilhada e forçadamente minúscula, passámos para vestidos sem forma (meios sacos de batatas), mas soltos, leves, livres.
Porquê? Porque nesta época as mulheres começaram finalmente a lutar pelos seus direitos e a contestar as regras da sociedade. E aqui cheguei finalmente à parte que mais me encantou neste museu:
Perceber que as alterações dos trajes femininos ao longo do tempo estão directamente ligadas à conquista de (mais) direitos das mulheres na sociedade. O espartilho – material e figurativo – caiu no abandono assim que as mulheres quiseram lutar pela liberdade, pela igualdade e por um melhor lugar na sociedade.
Na verdade, a luta pelo direito de voto feminino em Portugal foi uma longa batalha… Tendo começado em 1892, só em 1931 o voto foi concedido, pela primeira vez – embora com limitações – às mulheres.
Confesso que nos anos 80 e 90 fiquei um bocadinho decepcionada por só estar retratada uma realidade (a mais “normal”), uma vez que nos anos 50 e 70 estão retratadas também as subculturas mais populares da época. Nos anos 80 teria gostada de ver representações do forte movimento pop, com as suas cores garridas e objectos gigantescos (os brincos, por exemplo). Alguns acessórios podem ser vistos por lá, mas teria preferido ver pelo menos um outfit completo.
Já nos anos 90, esperava – claro – uma representação do vestuário grunge. Este é, talvez, o que mais falta me fez no museu.
No geral, fiquei encantada com o quanto o ser humano mudou em termos de gostos, de direitos (como já vos falei mais cima) e de hábitos, principalmente no século XX em que todas estas mudanças foram tão rápidas e em que vimos praticamente uma tendência completamente diferente de década para década.
Ainda é cedo, mas estou ansiosa por ver – daqui a muitos anos – a evolução do nosso vestuários nos anos 2000, embora hoje em dia as tendências não sejam tão marcadas e padronizadas como em épocas passadas.
E vocês, já tinham pensado que a nossa História se reflecte tanto no que vestimos? Já foram ao Museu do Traje? Gostaram? 🙂
8 Comments
Joana Sousa
15/03/2016 at 11:35 AMSo cool! E eu que ia dizer que a roupa interior era linda (aquele vestido é uma camisa de dormir? Oh pá é tão bonito!) e depois tu…pumbaaaa, nojeira! Ahahah!
Mas é mesmo giro ver a evolução. Acho que tenho que pensar seriamente em fazer aí uma visita! Os anos 30 e 50…ai 🙂
Jiji
joan of july
16/03/2016 at 5:06 PMAhahaha pois, teve que ser, Joana. Nem tudo é perfeito, não é verdade? 😛 Aquilo naquela altura era meio nojentinho, apesar de não se notar no aspecto exterior. Não deixa de ser interessante. 😀
E sim, acho que devias agendar uma visitinha quando voltares cá!
Marta Chan
15/03/2016 at 2:06 PMLembrasse quando te disse que ia ao Lumiar para uma entrevista do banco de tempo? Aproveitei e fui ao museu do traje. Tinhas razão, e divinal! Não só as roupas históricas e seus acessórios mas o espaço onde se encontra, tão encantador!
A tua descrição está belíssima, ainda aprendi mais umas coisinhas só que vi 😀
joan of july
16/03/2016 at 4:44 PMSim, lembro! 😀 É verdade, na semana passada nem consegui perguntar-te mais detalhes sobre isso.
Eu sabia que ias gostar! 😀
Algumas coisinhas fui pesquisar para complementar a descrição. Obrigada, Martinha! <3
Leonor Canelas
24/01/2021 at 1:55 AM“Victorian Secret” gosto da forma como vês o mundo! Nem era precioso fotografias.
Daniela
15/03/2016 at 2:57 PMNão conheço esse Museu, mas acho que ia adorar ver todos esses pormenores.:)
Beijinhos,
Another Lovely Blog!, http://letrad.blogspot.pt/
joan of july
16/03/2016 at 12:24 PMTenho a certeza que sim, Daniela, são encantadores e ainda mais ao vivo! 😀
Beijinhos*
Maria
16/03/2016 at 6:30 PMAwwww e eu vivi toda a minha vida em Lisboa e não conheço nem 1/3 da cidade. Eu acho que acabamos sempre por conhecer melhor outras cidades do que aquela onde vivemos, especialmente quando estas são grandes e capitais de um país. E isto tudo para dizer que também não conheço este museu.
O museu em si já dava para ser um museu. A decoração do edifício é simplesmente linda. E algumas destas peças são mesmo fantásticas. E uma vez que muitas das peças (ou todas mesmo) nas imagens não estão dentro de uma vitrine, nem imagino o trabalho que não deve dar em ter as peças todas perfeitinhas e sem pó ao fim de uma semana.
Adorei a tua analogia do espartilho e com a luta pelos direitos das mulheres. O que nos vestimos acaba também por ser uma forma de expressão, por isso até que acredito que literalmente possa ser totalmente usada para demonstrar muitas alterações na nossa cultura.