Há umas semanas atrás comprei três livros na Amazon que me pareceram inspiradores e essenciais ao meu processo criativo. Um deles foi o Steal Like an Artist do Austin Kleon. Já tendo lido o Show your Work, do mesmo autor, comecei a ler o primeiro esta semana e hoje deparei-me com algo que me fez pensar e remexer nas minhas próprias ideias e experiências.
No capítulo em questão, o autor falava sobre a importância dos hobbies. Até aqui, nada de novo, mas ele disse uma coisa que me deixou a pensar.
Em vez de sugerir que optemos entre hobbies e nos concentremos apenas num, devemos fazer tudo e saltar de uns para os outros quando estivermos fartos de um deles.
À falta de um hobby que relegámos ou do qual desistimos por não acharmos que tínhamos tempo para ele, se for um pelo qual sentimos paixão, vamos ficar com aquilo que ele chamou de “dor do membro fantasma“. Após ler e reflectir sobre aquilo, concluí que ele tem toda a razão! A paixão pelos nossos hobbies são como as pessoas por quem nos apaixonamos; não escolhemos os objectos do nosso afecto, a paixão simplesmente surge, forte e avassaladora. No caso dos hobbies, quando ignoramos um, estamos a evitar demonstrar paixão por ele e isso dói-nos. Podemos não perceber logo isso, mas a dor é verdadeira, mas como é uma dor diferente, raramente a identificamos como tal.
No livro Steal Like an Artist, Austin Kleon dá o exemplo de quando decidiu parar de fazer música e participar em bandas para poder dedicar-se em exclusivo à sua escrita, mas o resultado não foi o esperado. Em vez de se concentrar na escrita, não conseguiu parar de pensar que algo estava em falta nele e na sua vida e isso fazia-o sentir incompleto e desconfortável.
Isto fez-me pensar tanto no meu caso mais recente e foi impossível não estabelecer um paralelismo. Há tempos eliminei o ginásio da minha vida e decidi – para compensar a falta de exercício – apostar no “exercício orgânico”, o que fiz sempre que possível ou que me apetecia, mas cuja execução estava constantemente condicionada pelas condições meteorológicas. Ou pelo menos esse era o problema a que eu atribuía o facto de não o fazer tantas vezes. Mas não. Na quinta-feira da semana passada tive uma epifania: sentia genuinamente falta do ginásio, dos cheiros, das cores, dos momentos só para mim, de fazer exercício com outras pessoas a fazer o mesmo e não de fazer exercício num contexto em que tudo à minha volta está estático. Percebi que era, acima de tudo, o que me impedia de me exercitar em casa, o facto de me estar a mexer e do ambiente à minha volta estar tão quieto; sentia sempre que estava a fazer algo estranho naquele contexto. E então, na sexta-feira, voltei a activar a minha inscrição e aproveitei logo para fazer o tipo de exercício que me estava a fazer falta. Corri e corri e corri… Cansei-me, consegui escrever bastante à noite e dormi como um bebé.
Com isto, concluí o mesmo que o autor de Steal Like an Artist e de Show Your Work: que eliminar hobbies não faz com que nos concentremos em outros hobbies ou tarefas mais importantes, mas antes que nos impede de nos dedicarmos a 100% a algo por causa de uma espécie de dor fantasma que não nos abandona. E essa “dor” é a falta que algo nos faz, neste caso, o hobby que deixámos para trás. No meu caso, ir ao ginásio não me rouba tempo, ou melhor, ocupa tempo, mas o restante tempo que dedico a outras coisas é muito melhor aproveitado e rentabilizado.
Por isso é que quando alguém me diz que vai deixar de escrever no blog porque surgiu um novo projecto e que agora simplesmente não tem tempo para o blog, fico triste. Cada pessoa sabe o que é melhor para si e não quero dar uma de moralista, mas fico triste por mim, quando penso numa realidade minha em que não poderia dedicar-me a escrever no blog por iniciativa própria.
No dia em que isso acontecer, relembrem-me deste post, pode ser?
Já sentiram isto de que falo aqui?
20 Comments
Filipa M.
21/02/2017 at 1:14 PMJá me aconteceu exatamente isso e foi assim que percebi que tinha de voltar a escrever. Nunca mais parei. É como costumo dizer: parece que agora tudo faz sentido, tudo bate certo. Gostei muito de ler =)
joan of july
21/02/2017 at 1:19 PMObrigada, Filipa! E obrigada também pelo teu testemunho. 🙂
Já vi que temos uns tópicos e interesses em comum, vou seguir o teu blog já!
Analog Girl
21/02/2017 at 1:38 PMEu nunca assumi que me desligaria do blog para abraçar outros projectos, mas já o deixei em stand-by sem planear e custa-me horrores. Posso não estar tão prolífica como há uns anos atrás, mas sem dúvida que o blog se tornou importante para o meu equilíbrio. E agora ando com menos tempo para desenhar e pintar e ando cheia de comichões… no meu caso tem sido difícil gerir a (pouca) energia para alimentar as paixões. Mas nada como dar pequenos passos, um de cada vez… e faz sempre a diferença! 🙂
joan of july
22/02/2017 at 4:41 PMÉ assim que me sinto, com “comichões” sempre que me vejo privada de fazer algo de que gosto muito! Ainda bem que não abandonaste o teu blog, Joana, mesmo que escreves com menos frequência. 🙂
Analog Girl
21/02/2017 at 1:42 PMÉ verdade, eu sinto muito isso. Ao longo do tempo, por vários motivos (falta de inspiração ou de tempo), deixei o blog em stand-by e sentia que me faltava qualquer coisa. Agora ando numa fase de menor produtividade de desenho e pintura e também me custa. No meu caso tem sido sempre difícil gerir a (pouca) energia para as várias coisas fluirem como gostaria, mas dar esses passos, por pequenos que sejam já enche qualquer um de ânimo extra. 🙂
Daniela Soares
21/02/2017 at 3:05 PMConcordo plenamente Catarina. Por vezes isso acontece com os estudos também. Passamos o tempo de escola tão focados nos estudos que nos esquecemos de outras coisas e de outras capacidades tão ou mais importantes que os estudos!
Another Lovely Blog!, http://letrad.blogspot.pt/
joan of july
22/02/2017 at 4:30 PMPrecisamente, Daniela. O ideal seria atingirmos um equilíbrio perfeito, mas como é tão difícil, torna-se um desafio daqueles! 😛
joan of july
01/03/2017 at 3:31 PMCompreendo, Daniela, e é tão verdade!
Sandra
21/02/2017 at 5:13 PMConcordo plenamente Catarina! E é por isso que ler é tão importante pois faz-nos muitas vezes refletir sobre certos aspetos. Não devemos deixar para trás as coisas que realmente gostamos de fazer. Que sentido faz a vida sem as nossas paixões? Bjs **
joan of july
22/02/2017 at 4:28 PMCompletamente, Sandra! Não faz sentido nenhum! 😀
E sim, a leitura tem destas coisas, por isso é que é um dos meus hobbies favoritos e dos quais nunca me canso. 🙂
Beijinhos**
Daniela Salvador
21/02/2017 at 9:15 PMSem duvida, sinto isto muitas vezes. Quando ando muito atarefada com o trabalho começo a sentir imensa falta de meu hobbie, e já percebi que é melhor parar por um pouco fazer o que me apetece do que ficar a insistir em algo que já estou cansada. Depois quando volto flui tudo muito melhor.
Alias foi essa uma das razões que me levou a começar a ir ao ginásio as 7 da manhã. Não queria parar mas sabia que não ia conseguir parar o trabalho até as 22h, assim foi a mellhor maneira que consegui. E aliás adorei porque agora vou sempre de manhã. 😛
joan of july
22/02/2017 at 4:27 PMÉ isso! Não insistir no que nos está a drenar e dar espaço ao que nos faz felizes. Depois, tudo o resto flui com muito mais facilidade. 🙂
Nadia Martins Sepúlveda
22/02/2017 at 6:07 PMComo percebo essa sensação! É mesmo isso, parece que quanto menos tentamos pensar no “hobby” que amamos mais ele se insurge na nossa cabeça, a exigir atenção. Eu sinto isso quando, em períodos de maior estudo/trabalho, tenho de dedicar menos atenção ao blog, aos textos, à fotografia, parece que de facto aquela ausência dói, que quanto menos posso, mais quero fazer… Ao longo destes anos não tem sido fácil gerir tudo, e tive de desacelerar o ritmo do blog, mas parar…bem…parar ia fazer-me perder uma parte de mim!
joan of july
01/03/2017 at 3:31 PMComo te compreendo, Nádia. Sinto exactamente o mesmo; seria como perder uma parte de mim. 🙂
Rosana Vieira
22/02/2017 at 11:03 PMQue post maravilhoso! Acho que precisava de ler estas coisas. No meu caso, andava a adiar a criação de um blog há quase 5 anos! Por falta de tempo – dizia eu – e de coragem também, mas finalmente fi-lo! Obrigando-me a voltar a puxar mais pela minha criatividade e pesquisar sobre coisas de que gosto. Parece que de certa forma preencheu um vazio. Vamos ver se realmente era isto que faltava 😀
https://automaticdestiny.blogspot.pt
joan of july
01/03/2017 at 12:25 PMObrigada Rosana!
E que bom que seguiste em frente com a criação do teu blog! Uma das coisas de que mais gosto em ter o meu é precisamente o facto de me obrigar a puxar constantemente pela minha criatividade. 😀
inês
23/02/2017 at 1:58 AMAdorei este post e concordo plenamente. Adoro escrever no meu blog, pensar nos posts e trabalhá-los. Já em diversas alturas decidir deixar de o fazer por falta de tempo e fazia-me muita falta. Agora posso não ter muito tempo, mas vou escrevendo os posts ao meu ritmo e não deixo o blog de lado. Faz-me bem e isso é o mais importante.
joan of july
01/03/2017 at 12:36 PMQue bom que chegaste a esse equilíbrio, Inês. Quando é mesmo importante para nós e nos faz bem, custa-nos deixarmos de fazer algo. Acho que fazes muito bem em continuar a escrever ao teu ritmo. Não te preocupes com mais nada (frequência de publicação, obrigatoriedades com o blog, etc.), apenas em fazer o que te deixa feliz. 🙂
Marta Filipa Costa
28/02/2017 at 1:49 PMFiquei curiosa com os livros!
Nunca eliminei hobbies mas tenho dificuldade em conjugar tudo. Este ano decidi foi focar-me num objectivo por mês para cada hobbie e assim uns hobbies não roubam aos outros :p meio confuso, mas tem resultado e tenho atingido melhores resultados! 😀
joan of july
01/03/2017 at 3:11 PMOs livros do Austin Kleon são tão, mas tão bons!
Essa parece-me uma estratégia muito inteligente, Marta! 😀 Na verdade, tenho feito o mesmo desde que 2017 começou. O meu planner contempla precisamente essa estratégia. Tenho notado melhorias, confesso! 😀