Saber quando desistir foi das coisas mais úteis que aprendi na vida. Não sei indicar com precisão em que momento rejeitei o mantra do “never give up”, mas sei que algures deixou de fazer sentido quando descobri finalmente como reconhecer quando não faz mais sentido continuar com algo, seja um projeto, um livro ou uma relação.
“Never give up” – um mantra tóxico
Puxando a referência de Gone Girl (que eu adoro), “a cool girl never gives up”. Será? Para mim, é exatamente o oposto: “Cool girl knows when to give up”.
Este seria o meu novo mantra, se eu tivesse um.
Que sentido faz arrastar algo indefinidamente quando sabemos que não há volta a dar? Sinto que muita gente não desiste apenas por teimosia, por pressão e por medo do que vai parecer ou deixar de parecer. Aos outros, sempre aos outros.
Há coisas moribundas, desfalecidas e já em avançado estado de decomposição que só se vão estragar ainda mais se alguém não tiver a coragem de desistir. Isto é válido para muitas coisas, mas especialmente para relações. E sim, há uma componente fortíssima de coragem no que diz respeito à tomada de decisão (e consequente comunicação) de que nos vamos retirar do que quer que seja.
Coisas de que desisti na vida (e das quais me orgulho)
Sim, tenho orgulho de ter desistido de várias coisas na minha vida. Primeiro, pelo que disse mais acima: porque envolveram uma dose saudável de coragem. Depois, porque se desisti delas foi porque foi o melhor para mim e/ou para alguém de quem gostava/respeitava. E isso é muito positivo. Vou dar-vos alguns exemplos:
Bloggers Camp: Winter Edition
Quando eu, a Ana e a Cat organizamos o Bloggers Camp, houve uma ideia que chegou a ser comunicada e divulgada: o Bloggers Camp Winter Edition. O BC era feito sempre no Verão, mas nesse ano (2018, se não me engano), planeámos uma versão de Inverno, com direito a self-care, mantas, chocolate quente com marshmallows e, claro, as habituais talks e workshops que sempre caracterizaram o Bloggers Camp.
Long story short, revelou-se um pesadelo logístico (a ideia era ser em plena Serra da Estrela, as malucas…) e a verdade é que não estávamos a ter o interesse (aka vendas) que tínhamos esperado. A decisão lógica foi, como podem imaginar, largar esta ideia e caprichar na versão de Verão, que – essa sim – foi um sucesso!
Um livro que não funcionou
No mesmo ano em que publiquei o “Licenciei-me… e agora?” tive uma ideia para outro livro e já o tinha começado a escrever, quando me apercebi que não ia funcionar, não porque a ideia não era boa ou não funcionaria em livro, mas porque perdi o foco e a vontade de escrever sobre aquele assunto naquela altura. Isto não significa que tenha abandonado esta ideia para sempre mas, naquele momento e ainda hoje em dia, sinto que não vai acontecer.
Fica guardada na gaveta das ideias.
A razão pela qual desisti é simples: não acredito em escrever sobre algo que não estou a sentir no momento. Já me bastaram as dezenas e dezenas de trabalhos que fiz para a escola e para a faculdade, não acham?
Uma vez que escrever livros não é o meu emprego, escolho tratá-lo como um passion project, pelo que se a paixão estiver em falta… a escrita também estará.
De (ler) livros
Sabem, já fui daquele tipo de leitora que é simplesmente incapaz de deixar um livro a meio. Agora? Sou uma pessoa ocupada e que tem que fazer escolhas relativamente às atividades com que ocupa o seu tempo livre e não quero ocupá-lo com livros que não me trazem alegria, qual Marie Kondo literária.
Pronto, não têm que me trazer alegria propriamente, mas se me aborrecerem de morte e começarem a fazer-me sentir que lê-los é uma tarefa, então têm que ir.
Bye-bye, sayonara.
Natus Purus
Se calhar alguns dos leitores deste blog saberão do que falo, mas os novos não, por isso aqui vai um resumo:
A NatusPurus é uma marca de sabonetes e cosméticos de origem natural que criei com a minha tia em 2012/2013 quando estava desempregada. Teve algum sucesso, fomos à TV e aprendi a fazer sabonetes com as minhas próprias mãos. Também aprendi imenso sobre marketing, tanto que esta experiência me ajudou a arranjar emprego nessa altura. Com o novo emprego, fiquei com pouco tempo para o negócio, pelo que decidi sair e entregá-lo a 100% à minha tia.
A marca ainda existe e a minha tia continua a fabricar os produtos e a vendê-los em feiras de artesanato no Porto.
Creative Mornings
Em 2019, a Rafaela Mota Lemos (leiam-na na Yellow Letter, vale muito a pena!), convidou-me para ser co-host (sendo ela a host) do Creative Mornings Lisbon. Ora, eu era frequentadora dos eventos em Lisboa desde 2016 e super fã do projeto e do conceito, pelo que aceitei na hora.
Não querendo alongar-me nos detalhes, resumo também esta história:
Tive o meu acidente que me deixou sem andar durante cerca de três meses, divorciei-me e fui para o Porto durante quase dois meses curar o coração e o tornozelo (o último através de fisioterapia).
Cheguei a ir a dois eventos no início de 2020 como co-host, mas estava numa fase complicada em que estava entre sair de casa do ex e encontrar uma casa nova, enquanto começava uma nova relação. Para terem uma noção, mudei de casa 3 vezes em 2020, por isso conseguem imaginar o rebuliço que foi a minha vida nesse ano (que acabou por ser um dos melhores da minha vida até agora, curiosamente).
Pronto, aqui fiquei sem grande espaço de manobra para continuar neste projeto; estava a começar a ficar em falta com algumas tarefas e a sentir-me mal por isso, pelo que decidi não estar a prejudicar ninguém (nem o projeto) e sair. Mas custou-me horrores, acreditem, porque era algo que queria muito… Acredito mesmo que esta minha desistência foi a que mais me fez crescer e que mais ajudou a cimentar esta minha de que, por vezes, o melhor é abandonar o barco para que o resto da tripulação tenha melhores hipóteses de sobrevivência.
Desistir de pessoas, de relações e de empregos
Como disse mais acima, desistir não é só para projetos e livros. A arte de saber quando desistir também é válida para pessoas, relações e empregos. No fundo, é válida para tudo o que não nos acrescenta, para o que não conseguimos dar conta ou, pior, que nos faz mal.
Receita da desistência de trabalhos
Sempre que possam e sintam que um emprego vos traz infelicidade, desistam dele. Primeiro, decidam desistir dele, depois decidam encontrar outro melhor e quando o conseguirem, aí sim, deixem ir aquele que não vos faz feliz ou vos deixa confortável.
Receita para desistir de pessoas
A base desta receita é a mesma que a anterior, com a diferença que não é preciso substituir a pessoa da qual estamos a desistir antes de desistirmos dela. Podemos só deixá-la ir… Na verdade, eu nem acredito em substituir pessoas. Ninguém é igual a ninguém e ninguém nos vai fazer sentir exatamente da mesma forma que outra pessoa fez, para o bem e para o mal.
Eu estou numa fase em que finalmente já consigo reconhecer quando é que está na hora de simplesmente deixar ir relações de amizade. Foi algo muito difícil e que me fez sofrer bastante, mas acho que cheguei lá. Aprendi que há coisas que só vivem no passado e cuja história não tem tradução direta para o presente nem muito menos para o futuro. E está tudo bem.
… e quando eles desistem de nós
E quando são os outros a desistir de nós, huh? Também acontece e devemos estar preparados para isso.
Já foram surpreendidos com um despedimento ou com alguém a terminar uma relação convosco? Dói, às vezes muito, mas também acredito piamente que se foi assim, foi pelo melhor. Podem não sentir isso imediatamente, mas acreditem que, com o passar do tempo, vão concordar comigo.
A arte de saber quando desistir no podcast Par de Jarras
Eu e a Ana Garcês já abordámos este tópico no nosso Par de Jarras, mas sempre senti que queria abordá-lo também aqui no blog.
Seja como for, aconselho a ouvirem o episódio antes deste texto, depois ou em vez de, se assim preferirem. 🙂
Até lá, deixo-vos com estes memes que adoro e que ajuda a rir da situação quando desistências más acontecem connosco:
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