Recebi um comentário no meu artigo sobre os 7 livros que me inspiraram a escrever o meu no qual pediam que eu escrevesse um post a falar do meu processo de escrita do meu livro como forma de ajudar outras pessoas que estão a escrever ou que querem também escrever um livro. Portanto, este post é sobre isso e sobre alguns softwares e aplicações facilitadoras da escrita que eu encontrei e testei. Vamos a isso?
Eu entendo o quão importante este tipo de artigos pode ser para quem está a escrever um livro, eu própria li alguns, especialmente no Medium. A lógica que me leva a ler artigos destes é: se aquela pessoa que tem o mesmo estilo de vida que eu conseguiu fazer isto, então só se eu não quiser ou não me esforçar o suficiente é que não consigo!
E está certa esta lógica. Se eu consegui escrever um livro, porque não haverão vocês de conseguir também? Se tiverem uma ideia e vontade de a deitar cá para fora, como não conseguir escrever um livro? Não me venham com a desculpa da falta de tempo, porque já vimos que ao escreverem uma página por dia (que seja só uma página), têm um livro escrito ao fim de um ano.
I
Primeiros passos
Quantas páginas por dia?
Sim, é possível escrever um livro num ano escrevendo uma página por dia, mas apesar de ter começado por esse desafio não consegui escrever apenas uma página por dia. Quando tenho algo delineado na minha cabeça em termos de temas ou ideias, não consigo restringir-me a uma página. Durante a escrita do livro, houve dias em que a meta era escrever um capítulo ou metade de um capítulo e não menos que isso. Nem toda a gente funciona bem com metas, mas eu funciono, pelo menos no que diz respeito a não ficção.
Como começar?
É estranho estar a escrever sobre isto como se houvesse um manual de instruções para ensinar “como escrever um livro” quando não é esse o caso. Não quero que pensem que isto é um “how-to“, mas antes um “how I did it“, que extraiam o que houver para extrair e que adaptem à vossa situação particular.
Quando eu tive a ideia para o livro, vieram-me à cabeça imensos tópicos sobre os quais queria escrever. E o que haveria de fazer em relação a isso? Guardá-los cá dentro para escrever quando surgisse a oportunidade de os incluir no livro? Não! Nessa altura já os teria esquecido! Quando tiverem uma ideia sobre algo que querem escrever, anotem, anotem tudo, nem que se seja escrito por código, nem que não faça sentido, nem que sejam apenas palavras-chave! Sim, mesmo ideias para cenas (no caso da ficção) como:
plot twist: afinal o Dr. Howard não se tinha suicidado.
Há pequenas ideias que podem fazer toda a diferença na escrita de um livro ou de uma short-story; podemos não lhes dar a devida importância quando as temos, mas se não as anotarmos vamos chegar a uma altura em que vamos sentir falta de algo, vamos saber que já tivemos uma ideia muito boa, mas que a deixámos fugir e isto pode bem causar-nos um writer’s block.
Portanto, aqui o meu conselho é: anotem tudo, todos os tópicos, todas as ideias, nomes de personagens, cenários, etc. Numa fase inicial anotem tudo sem se preocuparem sequer com a organização e sequência. Isso fica para mais tarde. Depois de despejarem para o papel todas as vossas ideias, o resto fica mais fácil.
Quando escrever?
Esta é a questão que mais me fazem: como é que eu tenho tempo para escrever? Se ainda não viram, escrevi um texto inteiramente dedicado a este tempo neste post.
Resumidamente: quando eu tenho um desejo enorme de escrever e uma ideia poderosa, não a concretizar e não escrever é uma ideia que me pesa e magoa, por isso não o fazer não é uma opção para mim.
Quando a paixão é verdadeira – tal como numa relação amorosa – encontramos sempre tempo para ela. Se tiver que ser, acordamos mais cedo para escrever, almoçamos mais rápido e gastamos parte da hora de almoço no trabalho a escrever, deitamos-nos um bocadinho mais tarde, vamos sair menos vezes ao fim de semana,… tudo em prol da nossa paixão. Eu fiz pequenos sacrifícios horários para escrever e que valeram a pena. Dormi menos e descansei menos, mas cumpri o meu objectivo.
Foi assim que escrevi o meu livro.
Em resumo: como é que escrevi um livro mesmo?
- tive uma ideia – espontaneamente, mas algo que já queria fazer há imenso tempo. Um dia simplesmente senti um ímpeto gigante para escrever sobre isso;
- reuni inspirações literárias –> tirei esta foto com algumas delas no dia em que decidi começar a escrever o livro e escrevi este artigo sobre os 7 livros que me inspiraram a fazê-lo;
- anotei tudo o que me lembrei que queria incluir no livro, sem qualquer preocupação (inicialmente) pela organização do conteúdo;
- escrevi sempre as ideias no papel (ajuda-me imenso a raciocinar);
- depois das ideias para capítulos anotadas no meu caderno, foi fácil organizá-las por ordem sequencial;
- à medida que fui começando a escrever e os capítulos a tomar forma, fui adicionando pequenos elementos aos mesmos: frases inspiradoras, dicas de talks a ver no youtube relacionadas com o tema do capítulo, etc.
- não me forcei a escrever por ordem; ou seja, houve dias em que não estava inspirada para escrever sobre certos capítulos e nesses dias… não escrevia sobre eles. Passava à frente e escrevia sobre algo que me apetecesse mais;
- à medida que ia escrevendo mais e mais capítulos, fui ficando mais motivada: ajuda imenso vermos o nosso projecto a tomar forma;
- contactei a editora logo no início da escrita –> como obtive resposta rápida (em 2 dias, mais coisa menos coisa) e positiva, a minha motivação para terminar o livro disparou.
Por isso, se estiverem já com um livro no forma, não é nada má ideia contactarem já algumas editoras com um pitch do vosso livro e, quem sabe, até um ou dois capítulos.
II
Software e aplicações de escrita
A comunidade de escritores da internet é um mundo! Em Portugal e em sites portugueses ainda não se vêem referências a este tipo de aplicações (eu não vi, pelo menos), mas existe uma lista enorme de ferramentas digitais que nos ajudam a planear conteúdos, a organizar a nossa escrita com recursos a mapas, listas e divisão de capítulos, assim como a escrever melhor, no caso dos editores online.
Vou deixar-vos com algumas destas aplicações abaixo.
Hemingway
Hemingway é um site onde podemos escrever e editar directamente os nossos textos. Tem dois modos: escrita e edição (canto superior direito), mas só aconselho o da escrita, uma vez que não existe o modo edição para textos noutras línguas que não inglês. Enquanto espaço de escrita é muito agradável, clean e minimalista, sem distracções. Não me imagino a escrever lá textos para um livros, pois não tem como separar coisas (pesonagens, cenas, capítulos…), mas para escrever posts para o blog sem distracções é maravilhoso e já o usei com essa finalidade! É gratuito também, o que é sempre bom. 🙂
Flowstate
O Flowstate foi até a Lúcia que me mostrou. Um dia enviou-me um email a dar-me o link desta app porque a lembrou de mim e do meu gosto pela escrita. Infelizmente não existe trial e tenho algum medo de a comprar, não por ser cara, mas porque é assustadora! Passo a explicar: o Flowstate é para quem precisa mesmo de um grande empurrão para escrever. Na app, escolhe-se um intervalo de tempo (10 segundos, por exemplo) a seguir ao qual a app deverá intervir se não estivermos a escrever. Se estivermos a escrever há algum tempo e depois pararmos mais de 10 segundos, o Flowstate apaga-nos o trabalho todo!
Querem melhor motivação para escrever? 😉
Neste caso talvez esta app seja melhor para ajudar a escrever posts para o blog (sairiam num instantinho se tivesse esta app), mas para escrever livros completos talvez não tanto.
Evernote – “capture what’s on your mind”
Conheci o Evernote como um gestor de tarefas e bem bom, por sinal! Só não sabia que dava para escrever livros inteiros dentro do Evernote, mas pelos vistos há quem o faça. Na verdade, depois de ler esse artigo comecei também a escrever partes do meu segundo livro no Evernote. Ainda que prefira escrever directamente numa documento do Google Drive, estou a adorar o Evernote para planear capítulos, guardar imagens e fazer listas de ideias quando as frases inteiras ainda não saem. Para além de ser uma óptima ferramenta nesse sentido ainda é grátis! 🙂
Se estiverem interessados em utilizar o Evernote para planear um livro, espreitem também este artigo.
Scrivener – Literature & Latte
O Scrivener é o software mais mencionado na internet por escritores, sem sombra de dúvida! Apesar de não parecer a coisa mais intuitiva do mundo, também não parece ser assim tão complicado de usar e – confesso – a organização dele parece ser ideal. É um software pago, mas permite experimentá-lo através de um trial. Experimentar não custa, não é verdade? 🙂
Storyline Creator – the perfect tool to tell a story
Descobri o Storyline Creator há pouco tempo, mas como sempre fui atraída por um software cujo nome diz exactamente aquilo que faz. Neste software dá para criar cenas e personagens, bem como notas, dentro de secções específicos e não há nada que apazigue a minha OCD não diagnosticada como ter cada coisa na sua “gaveta”. Para além disso tem uma interface muito clean e agradável à vista, ou seja, à escrita.
The Most Dangerous Writing App
O modo de funcionamento desta app é basicamente o mesmo que o da Flowstate: ou escrevem dentro daquele (curto) período de tempo sem parar ou perdem tudo o que escreveram! Seu sei que pode parecer assustador, mas também pode ser uma experiência muito interessante!
Coggle – mapas e diagramas, ideal para planear cenas e acções num livro de ficção
Novlr -“built for writers by writers” – tem bom aspecto, acho que vou fazer o trial!
Milanote – das melhores apps que já experimentei para organização de ideias e conceitos visuais. É simples de usar e perfeita para uma organização com criatividade. Para além disso, ainda conta com templates específicos para escrita criativa, construção de personagens e de enredo! Basta clicarem no nome da app para irem ver os templates de que vos falo.
ByWord – só para dispositivos Apple (Mac, iPhone & iPad)
TwinWord Writer
Write or Die
Written? Kitten! – este não é nada sério, é uma brincadeira: a cada 100 palavras (ou mais, se quiserem) aparece uma nova imagem de um gato, uma motivação extra para escritores cat-lovers.
750 Words
Daily page – “became a better writer”
Mendeley
EditMinion
Outras ferramentas
Coffitivity – um site que emite sons ambiente de cafés para aumentar a produtividade de quem está habituado a escrever nestes ambientes.
Brain.fm – música e sons relaxantes para meditar ou produzir/escrever. As opções são: foco, relaxamento, meditação, sestas, dormir.
Claro que utilizar um software de escrita não é minimamente obrigatório para se escrever um livro, mas podem ter uma utilidade enorme e aconselho-vos a experimentarem alguns dos desta lista para descobrirem se facilitam ou não o vosso processo de escrita. 🙂
Espero que este post tenha sido útil a quem anda aí com ideias de livros no forno. Se tiverem perguntas para mim relativamente a este tema, estejam à vontade!
6 Comments
Ana
31/05/2017 at 6:02 PMBem, percebi logo que tenho cometido um tremendo erro: não anoto nada. Como as ideias que tenho têm sido soltas (apesar de dentro de um mesmo tema, não têm lógica entre si), acabo por não anotar porque as considero despegadas. Grande erro, estou a ver! Mesmo assim, no dia em que li o teu artigo sobre os livros que te inspiraram, houve logo um mini progresso: reuni e coloquei perto da secretária os livros e artigos que me inspiram e que me levaram a ter vontade de escrever sobre o tema. Pode não parecer muito mas, tal como as minhas ideias, as minhas inspirações estavam todas espalhadas pela casa – e depois de ler o teu texto senti que era importante reuni-las. Tenho mesmo de começar a descomplicar e a anotar as ideias que vou tendo, certamente mais tarde ou mais cedo vão fazer sentido. Como te tinha dito, ainda não me sinto a 100% para começar a escrever algo, mas queria começar a dar ordem às coisas – e as sugestões que deste aqui são importantes. Até porque, se pensar bem, é exactamente isso que faço com os artigos do blog: vou anotando ideias para depois dar ordem à coisa. Como um livro tem uma dimensão maior (mais assustadora) e prolongada, não tinha a mesma atitude – mas já percebi que tem de ser a mesma. Vou definitivamente experimentar o Evernote para poder anotar coisas quando não posso escrever em papel e ver se começo a colocar as ideias cá para fora, caso contrário este projecto nunca vai acontecer! Ah, essa foi outra coisa para a qual o teu artigo me inspirou: olhar para isto como um projecto. Pensava na questão do livro como algo que queria fazer um dia, mas não como um projecto. Agora, mesmo que saiba que não vai estar pronto nos próximos três ou seis meses, quero organizar/ir estruturando a coisa tal como qualquer outro projecto que tenho. Um que demora mais a ser construído, mas não deixa de ser um projecto. Quanto à questão do tempo, é como dizes: quando queremos mesmo, as coisas acontecem.
Muito obrigada pelas sugestões, Catarina!
ritamartins
31/05/2017 at 6:04 PMWow, que post super interessante sobre como escrever, conhecia apenas a Evernote mas realmente há um mundo de aplicações que nos ajudam a escrever imenso!
Já penso escrever um livro há seculos mas nunca avancei…tu e outras bloggers estão-me a dar uma força extra para pelo menos tentar. Eu já tenho alguns textos mas não sei como começar…qual a app /software que aconselhas a utilizar para já edição?
Vera Figueiredo
03/10/2017 at 8:13 PMAdorei o post, achei super útil principalmente a nível de aplicações e software!
O meu problema maior, depois de já ter um enredo mais ou menos pensado, é que tenho sempre novas ideias que podem também resultar (mas que fazem a coisa ir num sentido completamente diferente do que eu tinha pensado) por isso fico sem saber qual delas utilizar. Por isso tenho um príncipio, vários meios e nenhum fim porque não me consigo decidir pelos meios! E com esta brincadeira ando nisto há uns seis anos…! Alguma dica para este caso? ^^
Catarina Alves de Sousa
04/10/2017 at 3:16 PMMuito obrigada, Vera! 🙂
Como entendo o teu dilema… Mas olha, se ficares a debater-te com isso ad aeternum, nunca vais conseguir escrever o teu livro. A minha sugestão passa por dares primeiro vida às tuas personagens e deixá-las “respirar”. O que quero dizer é que muitas vezes, quando já criaste as personagens, começam a ganhar formas, personalidade, jeitos, etc., e tu percebes que têm (quase) vida própria, de tal forma que uma das histórias que tinhas pensado para elas começa a não fazer sentido. Ao mesmo tempo, começam a desenhar-se outras histórias cujo caminho é mais nítido na tua cabeça agora que já conheces as tuas personagens.
Se já tens um princípio, começa por aí! Não tentes ter a história toda pensada antes de a começar a escrever; deixa que ela se abra para ti, algo que tenho a certeza que vai acontecer, especialmente tendo já personagens e um início pensado.
Faz-te sentido? 🙂
Beijinho*
Mafalda Mascarenhas
04/10/2017 at 11:27 AMAdorei o post. Tem imensa informação útil. Também já pensei em escrever um livro mas parece tudo tão aterrador antes de comçear. Nem sei por onde começar. As apps ajudam-me a organizar ideias e a organizar atividades que parecem complexas. Tal como a Rita já conhecia o evernote, mas realmente a forma como organizar tudo e começar a escrever é excelente. Obrigada pelo post.
Catarina Alves de Sousa
04/10/2017 at 3:07 PMOh, obrigada Mafalda! Fico muito contente por teres gostado e espero mesmo que te seja útil de alguma forma, especialmente no que toca à organização de ideias. 😀
Força nisso!